Os ciber-cordelistas, poetas da rede



Paola da Cunha

CRLA-Archivos
Université de Poitiers
____________________________  

♦ 1. Viagem pela rede à procura dos poetas
♦ 2. O cordel virtual




Índice


















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Não sou uma grande especialista do cordel que conheci somente quando integrei o CRLA em 1998 para fazer o meu doutorado sobre os contos populares. Descobri então o acervo Raymond Cantel e desde então trabalhei juntamente com outros membros do nosso centro na organização, digitalização, difusão e valorização deste tesouro. O objectivo mais importante para nos é compartilhar este acervo com as pessoas interessadas e, para tal, os novos meios tecnológicos revelam-se essenciais. É portanto a relação da literatura de cordel com estes que mais me interessa, é procurar de que maneira utilizá-los para disponibilizar na rede o acervo com todas as particularidades da literatura de Cordel.

No âmbito deste trabalho, naveguei, desde 1998, muitas vezes na rede para consultar os acervos de cordel. Eu vi a literatura de cordel ocupar pouco a pouco um espaço cada vez maior. Não fiquei surpreendida porque, eu, que trabalhei com os contos populares, conheço a força de sobrevivência das tradições populares.

A utilização da internet pelo cordel é tão variada que decidi interessar-me mais particularmente pela utilização da rede pelos poetas cordelistas.


1. Viagem pela rede à procura dos poetas

Hoje muitos poetas criam e produzem seus folhetos directamente com os novos meios tecnológicos. Como diz Idelette Fonseca Muzart dos Santos, isto manifesta "mais uma vez, esta notável capacidade do cordel de «viver no mundo contemporâneo e dominar seus instrumentos e sua modernidade."[1]
 
A produção dos folhetos em offset, adoptada pela maioria dos poetas, revela-se mais rápida, mais barata e sobretudo permite produzir em poucas quantidades, sob encomenda. Mas a utilização das novas tecnologias pelo mundo do cordel ultrapassa a simples produção material dos folhetos. Com efeito, ele ocupa o espaço virtual, apropriou-se das potencialidades tecnológicas oferecidas pela Internet.

1.1 Sítios difundindo o cordel

Num primeiro momento, consultei sítios dedicados ou não somente ao cordel, nos quais os internautas podem ler em linha textos de cordéis de autores diferentes.

        Sítio da ABLC

A Academia Brasileira de Literatura de Cordel, que foi fundada em 1988, tem seu próprio sítio,[2] bem estruturado, dividido em rubricas. Na rubrica “cordéis”, 47 textos de poetas desaparecidos ou não, acompanhados ou não pela capa do folheto podem ser lidos. Pode-se portanto ler o folheto com o título A vida de Pedro Cem, de Leandro Gomes de Barros, ou A famigerada "Dança" do Creu, de Waldeck de Garanhus. A xilogravura que constitui um elemento importante do mundo do cordel também tem a sua rubrica. Na rubrica “loja” aparecem os folhetos que estão à venda. A partir de um blog, a instituição actualidades ou qualquer outra informação relativa ao cordel.

         Sítio Recanto das letras

O sítio www.recantodasletras.com.br oferece um espaço para que autores, sejam eles poetas, contadores ou qualquer outro, publiquem seus próprios textos. Os internautas podem acessar os espaços reservados ao cordel de várias maneiras: a partir da homepage, no menu situado na parte superior do ecrã, escolhendo a rubrica “textos” dividida por gênero de textos. O sítio dá para cada gênero o número de textos relativos. Com 12. 859 textos, o cordel é infelizmente pouco representado em relação aos contos com 95. 109, as crônicas com mais de 120. 000 textos ou ainda as poesias com 1. 236. 249.

Escolhendo os cordéis por entre os vários gêneros de textos, o usuário acessa uma lista organizada segundo a ordem cronológica de publicação. Os textos apresentam-se de um modo linear. A maioria dos autores dos textos de cordéis difundidos no Recanto das Letras, que escrevem outros gêneros de textos, escrevem por hobby, como por exemplo Ivan Sousa dos Santos, que se diz poeta amador, Henrique César (243 textos de cordéis), funcionário publico em Fortaleza, ou Carlinhos Cordel (83 textos de cordéis), professor em Cupira. Muito poucos são os autores que têm folhetos publicados. O poeta Marciano Batista de Medeiros do Rio Grande do Norte disponibilizou 16 textos de cordéis, enquanto Isamael Gaiao da Costa, engenheiro agrônomo em Recife, propôs 30 textos. Os internautas têm a possibilidade de deixar mensagens sobre os textos lidos.

O sítio Recanto das Letras permite aos autores criar um espaço personalizado como o fez Pedro Ernesto Filho,[3] originário do Ceará. Este advogado, formado na Universidade do Cariri, propõe no seu espaço além da leitura on line de seus textos, a audição de algumas das suas declamações. O internauta pode comprar seus folhetos na rubrica "Livros à venda", deixar uma mensagem no livro de visitas ou entrar em contacto com o poeta. O poeta mineiro Luiz Carlos Lemos, conhecido sob o apelido de Compadre Lemos,[4] também personalizou um espaço para expor e por à venda seus folhetos e outras obras. Ele integrou na rubrica "áudio" performances do poeta Patativa do Assaré.

I.2 Os blogs

Numerosos são os poetas que escolheram os blogs para pôr em linha seus textos. Com efeito, a criação e a administração de um blog são fáceis, mesmo sem nenhum conhecimento de informática. Ele permite combinar textos, imagens e links. O termo blog vem de weblog que se pode traduzir por “jornal na internet”, no qual o usuário escreve artigos, o último publicado sendo o que aparece em primeiro. Neste espaço virtual o autor pode discutir virtualmente com outros internautas, sendo esta interacção uma característica importante para os poetas cordelistas.

        Blog de Gianote

Gian Araújo, residindo no Rio Grande do Norte, iniciou em 2006 um blog, intitulado Cordelonline,[5] no qual retranscreve cordéis ou somente trechos de autores como Leandro Gomes de Barros, Paulo Nunes Batista ou Jessier Quirino.

 

        Blog de Allan Sales

No seu blog,[6] iniciado em 2008, o poeta Allan Sales, que reside no Recife, expõe seus poemas acompanhados pelas capas dos folhetos ou por uma ilustração. Esta difusão permite ao poeta, como ele próprio diz, compartilhar suas produções.

 

        Blog de Antônio Barreto

Professor, poeta e cordelista, Antônio Barreto intitula seu blog,[7] iniciado em 2008, A voz do Cordel. Na página “Inicio” disponibiliza a leitura de alguns de seus folhetos, acompanhados pela capa. Na rubrica “títulos publicados” estão listados todos os folhetos do autor, acompanhados pelas capas. No fim da lista aparecem os endereços dos locais em que se pode comprá-los. As pessoas interessadas também podem comprar os folhetos directamente ao autor. Os internautas têm possibilidade de deixar comentários.

 

        Blog de Salete Maria

Intitulado Cordelirando,[8] o blog da poetisa Salete Maria propõe a leitura de seus textos. A partir das capas situadas à direita do ecrã, o internauta pode ler a íntegra do folheto e deixar comentários.

 

        Blog de Osmar Machado

O poeta, cordelista e arte-educador Osmar Machado iniciou há mais ou menos 2 anos um blog,[9] apesar de ter muito hesitado. Com efeito, na rubrica “apresentação”, que ele intitulou “Como o poeta caiu na rede”, o artista diz que sempre suspeitou:

[…] dessas novas tecnologias, pois fazem a gente desejar uma após a outra, nos transformando em escravos delas. […] Muito relutei para fazer um blog... Prefiro a reflexão com os amigos íntimos, escrever cartas do que correio eletrônico, prosear com as pessoas do que falar ao telefone, deixar ensaios e críticas para o futuro. Mas fui convencido por outros e dissuadido por mim mesmo das necessidades de criar um. […] Nunca quis escrever num blog para corrigir o defeito: existem milhões de blogs, com milhões de efemeridades, tantas que não dá para saber se se fala com propriedade sobre o que é proposto. Quis criar este em virtude de expressar minha paixão pela cultura popular, principalmente sua poesia e música que são as áreas das minhas pesquisas. Utilizarei esse espaço para escrever ensaios, divulgar a literatura de cordel, a música e poesia popular, enfim, nossa cultura de raiz. Para isso, espero que ao lado das minhas experiências possa contar com as opiniões e sugestões dos leitores. Disponibilizarei alguns cordéis de minha autoria e indicarei fontes de pesquisa que tem me ajudado nos estudos sobre a literatura popular brasileira.

Osmar Machado propõe à venda ou em download gratuito os seus folhetos de cordéis.

 

I.3 Sítios de poetas

Poucos são, finalmente, os poetas que constituíram um sítio internet para difundir suas poesias. Mas tenho certeza de que nos anos que virão muitos vão explorar as possibilidades oferecidas pela rede.

        José Honório

Bancário, formado em turismo, o poeta pernambucano José Honório possui um espaço na rede no qual divulga seus poemas. Ele intitulou seu sítio O sítio do Cordelista Cibernético.[10] Aliás, na rubrica «biografia» ele diz : «Fui um dos primeiros cordelistas a utilizar o computador a serviço do cordel, primeiro para a impressão dos folhetos, depois para divulgá-lo através da Internet, e mais recentemente, para construir a poesia com parceiros virtuais, via e-mail ou MSN». Seus poemas apresentados numa lista podem ser lidos na rubrica “poemas”. Ao lado de alguns textos vêm as capas dos folhetos. Na rubrica chamada “almanaque” o poeta apresenta a sua agenda cultural, os seus poetas preferidos, fotos assim como uma série de links que ele costuma visitar. Os folhetos, CDs, livros ou qualquer outra obra do poeta estarão propostos à venda dentro de pouco tempo na rubrica “Bodega”. Em “contato” os internautas podem deixar mensagens ou contactar directamente o poeta a partir do endereço eletrônico.


        Walter Medeiros

No seu sítio intitulado Poemas de Cordel,[11] Walter Medeiros, escritor, poeta, jornalista e Bacharel em direito expõe 36 textos. Propõe também três outros textos escritos por Medeiros Braga.

        Marcelo Soares

Grande amigo do CRLA, Marcelo Soares, filho do Poeta Repórter, José Soares, é poeta cordelista e artista gráfico. Desde 2009, disponibilizou um espaço pessoal na rede[12] em que apresenta uma lista de seus cordéis anunciando que alguns serão disponíveis para uma leitura on-line. Na rubrica «contato» fornece seu endereço assim como seu e-mail. Também expõe suas xilogravuras na rubrica «Galeria».

        Chico Salles

Radicado no Rio de Janeiro mas originário da Paraíba, Chico Salles é músico e cordelista, formado em engenharia. Em seu sítio[13] criado em 2010, o artista permite a leitura dos seus folhetos no formato PDF ou a audição dos seus CDs sem os propor à venda. A homepage do sítio apresenta-se sob a forma de um blog em que o autor anuncia suas actualidades ou outras informações relativas ao cordel. Os internautas podem deixar mensagens ao autor na rubrica “contato”.

        Bule Bule

Antônio Ribeiro da Conceição que tem por nome artístico Bule Bule é músico, escritor, compositor, poeta, cordelista, repentista, ator e cantador. O poeta disponibiliza alguns textos de cordéis no formato Word. Na rubrica “mural” o internauta pode deixar mensagens.


        Valdeck Garanhuns

Originário de Pernambuco, Valdeck de Garanhuns, como se faz chamar, é poeta, artista plástico, arte-educador, ator, compositor, contador de estórias e mestre em Teatro de Mamulengo. Na rede, tem um espaço[14] em que apresenta as suas obras. Na rubrica « Cordel » o autor define a literatura de cordel e anuncia que dentro em breve disponibilizará dois folhetos por ele criados. Este sítio apresenta-se como um cartão de visitas em que o autor apresenta suas actividades ilustrando-as com obras por ele realizadas.

        César Obeid

Construído um pouco sob o gênero do sítio precedente, o sítio Teatro do Cordel, de César Obeid, também apresenta as actividades deste poeta que é também escritor, contador de historias e educador. Na rubrica « folhetos », o autor explica que « além dos meu livros, eu escrevo versos de acordo com o tema pedido. Os folhetos são editados na forma tradicional (1/4 de papel A4) e distribuídos ao público. Já realizei dezenas e dezenas de trabalhos para empresas, eventos, entidades, biografias, etc. » O autor propõe como exemplos 7 folhetos que realizou sob encomenda. O internauta pode deixar depoimentos ou entrar em contacto com o autor.

        Edmilson Santini

Ator de teatro de cordel, Edmilson Santini, originário de Pernambuco, também escreve folhetos de cordel. Estes folhetos estão à venda em seu sítio internet[15]criado em 2011 e no qual o autor apresenta também suas actividades teatrais.



        Marco di Aurélio

O poeta pernambucano Marco di Aurélio têm um sítio[16] em que oferece alguns de seus textos à leitura. Aproveitando-se das possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias, o poeta propõe a leitura interativa de um dos seus folhetos apresentado sob a denominação de « cordel interativo ». Na rubrica « blog » apresenta as suas actualidades.
Estes exemplos confirmam a forte presença do cordel na rede e contradizem aqueles que vinham anunciando a morte da literatura popular com o surgimento das novas tecnologias.



II. O cordel virtual

No folheto escrito em 1995 com o título O marco cibernético construído em Timbaúba, José Honório, cibercordelista citado mais acima, explica a razão que o levou a adoptar a internet e suas potencialidades para difundir suas obras:

Sou vate moderno, pois
uso a tecnologia
mas procuro ser fiel
à minha filosofia
de manter toda a estética
secular da poesia.

Confio que essa ação
de algum modo incentiva
alguém mais a escrever
e buscar alternativa
para que nosso cordel
se renove e sobreviva.

Musa minha, por favor
não se sinta desprezada
somente por minha lira
ficar informatizada
pois rendi-me a HIGH-TEC
pra vê-la ressuscitada.

José Honório assim como os poetas que adoptaram a internet compreenderam com efeito que para sobreviver tinham de se adaptar às novas tecnologias. Esta capacidade de adaptação já se verificou no passado como o sublinhou Sylvia Nemer[17] quando disse:

Rompendo com essa visão, de certa forma associada à imagem do cordel como uma manifestação a-histórica, expressão do arcaísmo dos seus grupos produtores e consumidores, a literatura de cordel hoje é vista como uma manifestação que já em seu nascimento, no final do século XIX, estava inserida na modernidade técnica, com os poetas utilizando as tipografias para a impressão de folhetos e os transportes ferroviários para a sua distribuição.

José Honório descreve no poema acima citado as fases sucessivas de adaptação pelas quais os poetas tiveram de passar para que sua arte sobrevivesse:

Nos primórdios desta arte
quando um poeta fecundo
escrevia seus romances
tinha um trabalho profundo
um a um, manualmente
reproduzia pro mundo.

Só depois veio a imprensa
com a sua tipografia
cópias mil rapidamente
brotavam de noite a dia
só assim se espalhou
no sertão a poesia.

E nas décadas recentes
com xerox e off-set
o cordel sobreviveu
naquilo que lhe compete
concretizar qualquer tema
que um poeta projete.

Se pena, lápis, caneta
cumpriram sua missão
e a máquina de escrever
deu sua contribuição
que mal há em nos valermos
da nova computação.

Nos anos 90, a literatura de cordel conhecia um período de declínio que muitos atribuíam ao rádio e à televisão. Porém, mais de 20 anos depois os novos meios de comunicação, e a internet mais de que qualquer outro, revelam-se importantes meios de difusão para o cordel como pudemos constatar com os numerosos sítios apresentados. Ao contrário do que vinham anunciando alguns pesquisadores, a literatura de cordel não desapareceu e bem pelo contrário soube encontrar estratégias de sobrevivência dentro dos novos meios tecnológicos. Rodrigo Emanuel de Freitas Apolinário, que efectuou uma pesquisa sobre a literatura de cordel na Paraíba,[18] diz:

[...] o cordel surpreende, inova e aceita a internet como um novo suporte. O cordel subsiste, sobrevive, apesar das idiossincrasias, intempéries, dificuldades e antropofagias da Indústria cultural midiática, globalizante, e da invasão cultural norte-americana. São imprescindíveis a divulgação na mídia e na web, distribuição eficiente, abertura de espaços e fóruns de discussão e de publicação de textos de cordel, de autores tradicionais e contemporâneos, para dinamização do movimento da Poesia Popular Universal. A Internet é um espaço primordial e dinamizador de nossa literatura popular.

E evidente que a passagem do cordel para o mundo virtual da internet provoca alterações na prática da poesia tradicional, mas estas alterações já vinham ocorrendo há vários anos. Com efeito, o cordel evoluiu ao longo dos séculos, adaptando-se às diferentes épocas e aos diferentes meios tecnológicos. Hoje, ocupa o espaço televisivo e radiofônico e usa novos suportes como os CDs ou os DVDs.

A literatura de cordel conheceu várias mudanças : mudanças de produção, de difusão, de concepção, de público. Os poetas populares que Roberto Benjamim[19] apresenta como mediadores entre a cultura popular e a cultura de massa já não são mais unicamente aqueles semiletrados que andavam de cidade em cidade. Hoje, muitos têm diplomas universitários. Muitos escrevem como lazer. Do mesmo modo, o público do cordel é muito mais diversificado como o dizem os autores de « Literatura de cordel no espaço virtual »:

Outra inferência que podemos evidenciar na importância da internet como ferramenta de propagação da Literatura de Cordel, é a expansão do público almejado pelo autor presente nesse espaço virtual. O público do Cordel se expandiu entre diferentes segmentos sociais: médias ou populares, urbanos ou rurais, intelectuais e pesquisadores. O novo leitor é o internauta de diversos níveis de aprendizado. É o estudante, o pesquisador, o universitário, o professor, a dona de casa, a criança etc., isto porque a internet está acessível a todos os públicos de maneira indistintamente e o autor pode publicar a quantidade que desejar, com temáticas que atraiam o interesse de diferentes leitores.[20]

Walter Medeiro, no seu poema A peleja do Cordel de Feira com a Internet, diz:

Pois agora na internet
O cordel vai mais distante
Basta somente um instante
E a história se repete
São Gonçalo do Amarante
Paris, Itu, num berrante
Todo mundo se derrete

A internet oferece aos poetas um excelente espaço de difusão que permite ao cordel atingir assim um público cada vez maior, cada vez mais longe. Arinélio Lacerda e José Hélder Pinheiro dizem a respeito desta potencialidade da internet:

Muitos poetas souberam utilizar a internet a seu favor e com esta inserção a Literatura de Cordel conquistou novos espaços, dando oportunidades a novos autores de mostrar seus poemas, intensificando a divulgação dos folhetos e outras produções não apenas em uma região, mas em todo território nacional, já que essa ‘troca’ de conhecimento entre poetas e leitores que a internet proporciona consegue chegar a locais antes inacessíveis pelos cordelistas.[21]

A internet permite ao poeta, não somente escrever suas narrativas e as expôr à leitura de uma maioria, mas também trocar ideias com outras pessoas. Com efeito, em todos os sítios consultados, os internautas podem deixar mensagens aos autores, entrar em contacto com eles. Permite intercâmbios entre poetas, pesquisadores, estudantes e quaisquer outras pessoas interessadas. A internet revela-se, segundo Arinélio Lacerda e José Hélder Pinheiro, « um canal de comunicação direta e interação com o usuário ou visitante. São essas particularidades, que tornam os sítios e os blogs diferentes das demais mídias, como o rádio, a televisão e o próprio jornal impresso. »[22]

A mudança de suporte não modificou as formas poéticas e muitos dos poetas consultados afirmam respeitá-las. Maria Alice Amorim, que colocou na internet o catálogo do seu acervo, diz por sua parte que « […] é possível dizer que a tecnologia entra na reengenharia do verso, na condição de ferramenta, sem desfigurar a fisionomia do cordel ou uma “estética secular” defendida pelo poeta. »[23]

Todavia, se ele atinge um público mais afastado e mais numeroso, uma das maiores perdas provocada pela mudança de suporte é sem nenhuma dúvida a falta de contacto directo entre o poeta e seu público. Antigamente, a leitura ou a declamação dos textos frente a um público permitia ao poeta constatar se a história era boa ou medíocre. Os momentos de encontro para ouvir contar as histórias contidas nos folhetos já vinham diminuindo devido em grande parte ao surgimentos das novas mídias. Estes encontros para escutar as histórias não eram apenas motivados pelo facto de as pessoas não saberem ler mas também pelo prazer da convivência.

Martine Kunz[24] diz a este respeito que: “Não podemos pensar no cordel como um texto independente do seu advento sonoro, de sua performance que supõe a presença física e simultânea daquele que conta e daquele que escuta.” Em alguns sítios, os poetas colocaram gravações em áudio ou vídeos de suas performances. Mas os ciber-cordelistas ainda não utilizaram todas as potencialidades da internet, que permite reunir, texto, som e imagem. Os sítios não traduzem perfeitamente o mundo do cordel. Como o afirma Aléxia Brasil, que trabalhou em um projecto de cordel virtual

Image, texte et son présents dans l’univers du cordel constituent son identité. Une approche dichotomique entre pratique orale et texte imprimé ne permet pas de le décrire. Le cordel représente bien davantage que le folheto, c’est la narration lue ou chantée, c’est l’image de la gravure et c’est l’image imaginée.[25]

Muitos receiam que a internet provoque o desaparecimento dos folhetos. Todavia, os ciber-cordelistas continuam, por enquanto, a publicar seus textos também no suporte papel. Mas se isto acontecer, diremos somente com José Honório:

Não importa por qual via
o verso chegue ao leitor
se impresso em tipos móveis
fax ou computador
impor sim, que traduza
um espírito criador.










Notas

[1]. I. Muzart Fonseca dos Santos, «Narrativa e imaginário na literartura de cordel brasileira : o cruzamento das linguagens e das modernidades», in: S. Nemer (org.), Recortes contemporâneos sobre cordel, Rio de Janeiro, ed. da Casa Rui Barbosa, 2008, p.19

[2]. Http://www.abcl.com.br/. Consultado em agosto de 2011.

[3]. Http://www.perfilho.prosaeverso.net/index.php. Consultado em agosto de 2011.

[4]. Http://www.compadrelemos.com/ Consultado em agosto de 2011.

[5]. Http://www.cordelonline.zip.net/. Consultado em agosto de 2011.

[6]. Http://www.allancordelista.blogspot.com/. Consultado em agosto de 2011.

[7]. Http://www.barretocordel.wordpress.com/. Consultado em agosto de 2011.

[8]. Http://www.cordelirando.blogspot.com/. Consultado em agosto de 2011.

[10]. Http://www.josehonorio.com.br/ Consultado em agosto de 2011.

[11]. http://www.rnsítios.com.br/cordeis.htm. Consultado em agosto de 2011.

[12]. http://www.marcelosoares.org/ Consultado em agosto de 2011.

[13]. http://www.chicosalles.com.br/. Consultado em agosto de 2011.

[14]. http://www.valdeckdegaranhuns.art.br/. Consultado em agosto de 2011.

[15]. http://www.teatroemcordel.com.br/index.php. Consultado em agosto de 2011.

[16]. http://www.marcodiaurelio.com/cordel.php. Consultado em agosto de 2011.

[17]. S. Nemer, op. cit, p. 10.

[18]. R. E. de F. Apolinário, « Literatura de Cordel na Paraíba: da Serra de Teixeira à Internet », Universidade Estadual da Paraíba. Trabalho apresentado no III Intercom Júnior – Jornada de Iniciação Científica em Comunicação do XXX. Consultado em http://www.intercom.org.br/papers/regionais/nordeste2007/resumos/R0616-1.pdf, em agosto de 2011.

[19]. R. Benjamim, « Os folhetos populares intermediários no processo da comunicação 40 anos depois », in : S. Nemer (org.), Recortes contemporâneos sobre cordel, Rio de Janeiro, ed. da Casa Rui Barbosa, 2008, pp. 99-107.

[20]. A. L. dos Santos Júnior e J. H. P. Alves, « Literatura de cordel no espaço virtual » (UFCG), comunicação apresentada durante o 4° Coloquio de Estudos Linguísticos e Literários na Universidade Estadual de Maringá, 9, 10 e 11 de junho de 2010 – ANAIS. Consultado em http://anais2010.cielli.com.br/downloads/58.pdf, em agosto de 2011.

[21]. Ibidem.

[22]. Ibidem.

[23]. M. A. Amorim, « Existe um novo cordel ? Imaginario, tradição, cibercultura », consultado em agosto de 2011.

[24]. M. Kunz, "Rodolfo Coelho Cavalcante: un cas de duel entre oralité et écriture", in: J.B. Martin (org.), Littératures Orales, Paroles vivantes et mouvantes, Lyon, Presses Universitaires de Lyon, 2003, p. 206.

[25]. A. Brasil, Cordel Digital. Fortaleza: Edições Leo, 2005, p. 10.